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terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

MEU CARNAVAL 2012


Fiquei seco de palavras. Fui ao cinema, li um livro, li revistas, naveguei horas pelo mar da web e a sede não morria. Não tinha mais nada para contar, ou pior, não tinha mais vontade de escrever... Depois da chuvarada de reclamações de uma ala da família pelo tom que eu infringia aos meus textos, fiquei meio sem norte. É “curioso” ter que lembrar, mas eu tenho uma alma, eu tenho sentimentos, eu sou uma pessoa e se me morderem dói e sai sangue! Achei que as ondas iriam se aquietar ao amanhecer, mas continuam agressivas mesmo tendo a chuva parado; nunca vi onda agarrar as pernas para o fundo, até onde sei quem faz isso é a correnteza... Puta que o pariu, arranjei ondas malucas como parceiras do meu dia-a-dia!! Conheço uma pessoa que foi muito próxima a mim que me disse uma vez: “Se você tivesse demorado mais 5 minutos para nascer teria nascido gay!” O motivo dessa análise de fundo psico-hormonal sobre a minha pessoa é porque eu não gosto de carnaval (quem já viu um, salvo raríssimas exceções, já viu todos). Eu não gosto do povo do carnaval, de suas urinadas na rua, de suas latas de cerveja no chão “abrilhantando” a festa, desse sentimento que esse povo tem de que é dono do mundo e habilitado a fazer o que quer, onde quer e foda-se você!!! Eu não gosto do repetitivo som do samba-enredo onde se trocam apenas as letras e muitas vezes nem isso. Eu não gosto de ter meus acessos fechados porque as “trocentas” bandas vão passar as 14, as 15, as 16, às 18hs... Eu não gosto de ver a praia virar uma latrina e dormitório. Enfim. É isso aí! O outro motivo que levou essa pessoa a concluir sobre a minha masculinidade, caso se eu tivesse demorado a nascer, é porque eu não gosto de futebol... Eu fiz outros esportes na minha vida: natação por muitos anos, pratiquei judô e até saltos ornamentais (eu vivia com um sorriso congelado na cara de tanta carada na água até acertar um salto... Ainda bem que eu não usava dentadura...). Mesa redonda, então, com aqueles caras falando de uma seriedade pungente como se estivessem debatendo a paz no mundo ou sobre a cura do câncer, me dá sono; ao menos serve para alguma coisa. Veja, não estou falando da copa do mundo onde meu sentimento nacionalista cresce mil por cento, adoro copa do mundo, mas joguinho de fim de semana com alguns dos jogadores ganhando quase 1 milhão por mês somados salários, benefícios, propaganda e suas imagens em produtos esportivos e perde um pênalti... Não é a minha praia! Gostaria que ficasse registrado que a comunidade gay adora carnaval e futebol... Que merda de análise psico-hormonal foi essa?? Nossa! Viajei e perdi o foco do meu texto... Apesar de não gostar de carnaval aceitei ontem o convite do meu irmão em visitar o bairro onde moramos por 8 anos. Ele fez uma propaganda danada de um cara que monta uma barraca na frente da casa dele e faz um churrasco maravilhoso. Fui! Eu não voltava a esse bairro há 36 anos. Fui em parte por curiosidade, em parte porque não tinha nada para fazer, em parte porque gosto da companhia do meu irmão e porque estava com fome. Finalmente eu estava sentado na área de refeição da Rua Tereza Cavalcanti comendo uma picanha com aquela gordurinha que gruda nas coronárias, absolutamente deliciosa. Agora que meu barco está à deriva e solitário no mar da vida, passei a valorizar bastante esses momentos família. Ontem à noite a temperatura estava agradabilíssima, tomei uma cerva muito muito gelada, comi picanha com farofa na companhia do meu irmão, da minha cunhada e do meu afilhado querido de 5 anos. Foi tudo muito light. Gostei imensamente. Quando estávamos nos encaminhando para o carro, talvez motivado por estarmos juntos no bairro em que moramos há 36 anos ele lembrou de uma história que fez esse meu carnaval valer à pena. Na casa ao lado da nossa morava o Fábio, um garoto legal que brincava com a gente, hora estávamos na casa dele, hora ele estava na nossa. Ele tinha um pai durão, machão, antipáaaatico... Um dia, eu com 12 anos e meu irmão com 8 anos, fomos na casa do Fábio para jogar bola de gude e nisso o pai dele sai por detrás das sombras, aponta seu dedo colt 45 na minha direção e diz: “Você está muito velho para brincar com eles, é melhor você ir para sua casa...” Me senti horrível! Como eu poderia ser velho com 12 anos? Eu tenho 52 e não me sinto velho. Algumas das emoções que senti naquela hora não foram plenamente decifradas por mim, mas hoje posso classificá-las como: ofendido, humilhado, injustiçado e finalmente puto da vida... Enfim, recolhi minhas bolas de vidro no saquinho e fui para casa... Meu irmão continuou por lá e confesso que não achei nada de mais, o rejeitado fui eu, não ele! Essa foi à história que meu irmão lembrou e que estava meio embaçada por tanto pó acumulado sobre suas imagens, mas que ao ouvi-la lembrei perfeitamente. Então ele concluiu dizendo: “Eu achei um absurdo o que o pai do Fábio fez com você. Me senti muito mal. Nós éramos crianças. Eu devia ter me levantado e ido embora contigo, mas acabei ficando. Desculpa!!!” Desculpa??? Tomei um susto, o pássaro da emoção bicou meu peito. Confesso que nunca havia parado para pensar sobre isso, porque na verdade é um episódio bobo... Fábio hoje deve estar cheio de filhos preocupado com os namorados das filhas... O pai dele morreu de ataque cardíaco há muitos anos... Eu não jogo mais bola de gude e meu irmão está com 48 anos. Mas o que faz essa história ser tão especial para mim é que meu irmão com 8 anos foi solidário comigo e eu nunca soube disso. Continuamos andando em direção ao carro, agi como se nem tivesse ouvido direito sua história ou que não tivesse dado a devida importância. Roberto, por sua vez, ficou em silêncio. Talvez estivesse se sentindo bem por ter feito algo bom para si mesmo, talvez tenha desembrulhado de um jornal velho e amarelado uma história antiga e passado a limpo um texto escrito com garranchos, talvez o cosmo esperou o dia e a hora de um dia de carnaval para, de uma maneira simples e sincera, dar uma resposta aquele garoto de 12 anos que ainda vive neste meu corpo de 52. Agora escrevendo este texto choro de emoção. Essa sopa emocional envolve muitas lembranças, minha vida, meu pai morto, minha mãe com Alzheimer, meus dias, meus filhos, minha ilha deserta, minhas ondas... Todos nós temos nossos momentos triviais em que os anos vão acrescentando pinceladas de tinta grossa e de cores vivas; nem tanto pela importância do ocorrido, mas pelo laços emocionais que se fixam em nossas almas como ostras que se agarram nas rochas... Na maioria das vezes e na maturidade que o tempo nos agrega, essas lembranças e análises ficam na beira da garganta e ali montam moradia... Porque quase sempre não temos mais chance de esclarecer, de rever juntos, de pedir desculpas. As pessoas envolvidas ou morreram ou se foram ou não querem lembrar... Mas desta vez foi diferente, meu irmão me pediu desculpas depois de 40 anos. Fiquei quieto para não provocar meus olhos e manter meu coração apenas batendo. Irmão, tá desculpado! Obrigado pelo melhor carnaval da minha vida! Quando a gente acha que já chorou por tudo, a vida renova seu estoque de surpresas e tira da sua cartola novas emoções que nos alimentam...

Esquindo lele... esquindo lala...

Viva a vida!!!






























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